Considerações sobre o novo prejuízo financeiro da Petrobrás

Vendas de diesel e gasolina

Por Éric Gil Dantas

Apesar do anúncio de prejuízo de R$1,5 bilhão para o 3º trimestre de 2020, a Petrobrás obteve um chamado “lucro líquido recorrente” – quando se exclui eventos extraordinários, como o pagamento de R$1,9 bilhão para um programa de anistia fiscal neste trimestre – de R$ 3,2 bilhões, revertendo o prejuízo do trimestre anterior e demonstrando que a crise no setor de petróleo já se amenizou. Se compararmos ao 3º trimestre do ano passado ainda teremos em geral números inferiores, afinal de contas mesmo com a recuperação parcial do atual preço do barril de petróleo (que na média para o 3º tri/20 foi de 43 dólares), ainda assim o preço está 30% abaixo do mesmo período do ano anterior, e os preços dos produtos derivados de petróleo também estão com um valor 11% menor do que o mesmo período do ano passado.

Apesar do contínuo aumento das exportações de petróleo cru, principalmente para a China, o que realmente puxou a recuperação da empresa foi a retomada das vendas de diesel e gasolina, que juntos somam 41% de todas as receitas provenientes de venda de produtos, enquanto que o petróleo cru exportado significa 30% do total. Se comparado ao trimestre anterior teremos que o diesel teve uma retomada em R$ de 45% e a gasolina de 86,7%, enquanto que o conjunto da venda de derivados teve uma retomada de 51,4%. Este aumento de vendas veio junto à subida da utilização da capacidade instalada das refinarias brasileiras, que havia tido sua subutilização aumentada drasticamente por conta do aumento das importações de derivados por parte da Petrobrás. Isto mostra como os parques de refino são fundamentais para os resultados financeiros da estatal, mesmo com a constante propaganda de que o que importa é a extração de óleo no pré-sal.

Estes melhores resultados se expressam em um aumento no EBITDA (Lucros antes de Juros, Impostos, Depreciação e Amortização), que cresceu 33,8% em relação ao trimestre anterior, e ficou 2,6% acima do que o mesmo trimestre do ano passado (que também teve uma ajuda da desvalorização do real diante do dólar médio de venda dos produtos, desvalorização esta de 35,5%).

Algo que chama a atenção é a cada vez mais acelerada diminuição dos investimentos da empresa. Segundo as palavras de Castello Branco na sua mensagem presidencial, “submetemos nosso portfólio de projetos a um teste de stress. Dada a escassez de capital e a necessidade de reduzir nossa dívida para US$ 60 bilhões, os projetos devem competir por recursos. Apenas aqueles resilientes a um preço médio de US$ 35/boe foram aprovados. Como consequência, nossos números de Capex para os próximos anos serão menores. Nosso objetivo é maximizar valor, não maximizar produção”. Ou seja, diminuir a dívida em detrimento de qualquer outra coisa. É importante chamar a atenção que o valor de referência para o brent citado por Castello Branco está extremamente pessimista para a realidade – a empresa manteve a previsão totalmente distorcida de que só atingirá 35 dólares em 2022, mesmo hoje este patamar já estar próximo ao de 40 dólares.

A empresa anunciou também ontem que os acionistas terão direito de receber dividendos mesmo se a empresa apresentar prejuízo contábil, basta ter conseguido diminuir a sua dívida líquida! Parece que o único dever da Petrobrás agora é pagar dívida, com diminuição de investimentos e privatizações. Isto pode ser visto no gráfico abaixo, com os dados de Capex (valores investidos) por trimestre, que chega ao menor patamar dos últimos anos.

Gráfico 1 – Valores investidos (Capex) por trimestre – em bilhões de reais

 

Fonte: Petrobras Desempenho Financeiro

Se por um lado os investimentos estão ladeira abaixo, por outro os “desinvestimentos” não param de crescer. Desde o início do ano a Petrobrás já concluiu ou assinou a venda: (i) da PO&G BV; (ii) do Polo Tucano Sul; (iii) Polo Macau; (iv) dos 10% remanescentes da TAG; (v) do Polos Pampo e Enchova; (vi) do Polo Lagoa Parda; (vii) do Polo Pescada; (viii) do Polo Cricaré; (ix) do Polo Rio Ventura; (x) do Polo Fazenda Belém; e (xi) da PUDSA (ativos no Uruguai). Além disto ainda tem cinco ativos na fase vinculante: oito refinarias, ativos na Colômbia, quatro eólicas, Gaspetro, 10% da NTS, PBio, UFN-III, Usinas Termelétricas a Óleo e a Gás, campos em terra em mar no Rio de Janeiro, campos terrestres em água e mar em Alagoas, campos terrestres no Amazonas, Bahia, Ceará e Sergipe, campos de águas rasas na Bahia, Ceará, Espírito Santo, Rio e São Paulo, e águas profundas em Sergipe e Espírito Santo. Além de vários outros ativos ainda em fase “não-vinculante”.

Em síntese, os resultados mostram uma considerável recuperação da Petrobrás diante da crise do petróleo (também verificada no restante do setor, apesar de a 2ª onda de Covid-19 causar dúvidas), a importância do setor de refino para esta recuperação e a continuidade dos planos de Roberto Castello Branco (sucatear, privatizar e garantir a alegria dos acionistas).

É fundamental convencer a população o mais rápido possível que todos os resultados positivos da Petrobrás, como mostram os dados, são decorrentes da ainda existência do refino e fruto de investimentos bilionários anteriores para o pré-sal. Além de que Castello Branco, assim como seus antecessores, destroem as bases de sustentação da empresa entregando todo ouro aos seus amigos do mercado.

*Economista do Instituto Brasileiro de Estudos Políticos e Sociais (Ibeps), é doutor em Ciência Política pela UFPR e pesquisador de pós-doutorado na FGV-SP.