Bendine dá as cartas, mas não é o dono do jogo. Desmonte da Petrobrás é parte do ajuste fiscal

Análise

Com razão, os petroleiros e petroleiras estão apreensivos. Os ataques à Petrobrás não param. Exagero? Faça um teste. Entre no site da Petrobrás aos investidores e clique na seção Comunicados e Fatos Relevantes. Agora faça um pequeno passeio com o mouse pelas últimas notícias. É o retrato do desmonte da maior empresa do país. No dia 7 de março, informações sobre o incêndio na Unidade de HDT da Refinaria de Pasadena, no dia 4 de março esclarecimentos sobre as notícias envolvendo perdas com a refinaria do Japão e sobre a venda de campos terrestres; no dia 2 de março o anúncio de dois fatos relevantes: a venda de campos terrestres e da Petrobras Argentina. Tudo isso numa única página.

Sem sombra de dúvidas, a Petrobrás sofre hoje um dos seus mais graves ataques desde o governo Fernando Henrique Cardoso, responsável pela quebra do monopólio do petróleo e pela abertura do capital da companhia na Bolsa de Valores de Nova York. Isso sem citar a famigerada tentativa de mudar seu nome para Petrobrax, símbolo máximo da tentativa de privatiza-la por completo.

Mais de duas décadas depois, novamente a empresa é alvo dos interesses privatistas. E embora seja justo chamar o presidente Aldemir Bendine de Vendine, pois são seus dedos que assinam os documentos responsáveis por selar o desmonte paulatino da Petrobrás, devemos reconhecer: o projeto de privatização da Petrobrás é parte do ajuste fiscal do governo Dilma e está longe de ser um problema restrito aos petroleiros.

Saída equivocada para a crise
A crise que a Petrobrás sofre hoje não está alheia ao que ocorre no país. Pelo contrário, é parte importante deste enorme clima de instabilidade econômica e social que reina no Brasil. A tentativa de retirada de direitos, o silêncio sobre a PLR, o desinvestimento, com as demissões em massa de terceirizados e venda de ativos valiosos por preço de banana, fazem parte de um pacote de medidas do governo para despejar a conta da crise nos trabalhadores e no povo pobre.

É uma resposta aos acionistas, aos especuladores, à grande imprensa – uma tentativa de seguir tendo a confiança da mão invisível e poderosa do Deus-Mercado. Por isso, desde 2015 anuncia quase diariamente um novo ataque: reforma da previdência, restrições ao seguro-desemprego, PIS e pensão por morte, PPE (programa de proteção ao emprego), que reduz jornada com redução salarial, e um longo e doloroso etc. É isso o que explica, por exemplo, a aliança entre Dilma e PSDB para a aprovação no Senado do PLS 131, que tira da Petrobrás a exclusividade da operação sobre o pré-sal.

Mas o resultado, até agora, não tem sido suficiente para agradar uma elite que sempre foi gulosa e nunca se contentou com pouco. Querem mais medidas, leia-se mais ataques, para a preservação de seus negócios e lucros. Tudo isso à custa do suor da classe trabalhadora. Dois exemplos do que ainda se exige: a aprovação do PL 4330, que autoriza a terceirização em atividades-fim, e a aprovação do antigo ACE (Acordo Coletivo Especial), que em resumo significa que o negociado prevalece sobre o legislado – uma brecha significativa para acordos rebaixados.

Em coletiva de imprensa recente a um grupo de jornalistas, Dilma reafirmou a defesa dos ataques anunciados recentemente. Com todas as letras, defendeu que a população trabalhe “um pouco mais” e como medida positiva anunciou: “Nós vamos este ano ainda leiloar aeroportos, portos, rodovias e ferrovias, porque isso faz parte também do crescimento do país”. Antes, ainda havia constrangimento em admitir esse tipo de política, hoje é anunciada com orgulho. Um absurdo.

Não são coincidências
Os cortes anunciados pela Petrobrás para conter a sua crise, seja através da reestruturação administrativa, seja de modo mais direto com o desinvestimento, são muito parecidos com a política adotada pelo governo federal. Primeiro, porque prejudica sobretudo os trabalhadores. Bendine tenta retirar direitos e vender o patrimônio da empresa para gerar caixa e ter avaliações mais otimistas do mercado e dos analistas. Dilma corta investimentos em saúde, educação e moradia, ataca direitos trabalhistas, para ter avaliações otimistas do mercado e dos analistas e recuperar a governabilidade.

Soma-se a isso um fato simbólico. Dias após a reestruturação da Petrobrás, uma empresa de economia mista controlada pelo governo, a Caixa Econômica Federal, uma empresa ainda 100% pública, também anunciou recentemente sua reestruturação. E com um discurso muito semelhante ao da direção da Petrobrás. Segundo Miriam Belchior, presidente da Caixa, “as mudanças visam adequar o banco ao atual cenário econômico e torná-lo mais eficiente e competitivo”.

Ou seja, só temos duas opções: ou acreditamos que se tratam de tristes coincidências ou chegamos à conclusão de que essas medidas fazem parte de um mesmo projeto. Um mesmo projeto do governo federal. Um mesmo projeto com um mesmo objetivo: despejar em nossas costas a conta de uma crise que não produzimos. Não estamos diante de coincidências. Somos alvos de um ataque articulado.

Qual o caminho?
Há alguns meses, desde o aprofundamento da crise da Petrobrás e do país, o Sindipetro Litoral Paulista vem defendendo uma ação que ainda segue pendente: a união de todos os trabalhadores, das mais diversas categorias, contra os ataques desferidos pelos patrões e pelos governos, incluindo aí um Congresso Nacional cada vez mais reacionário.

Durante nossa greve, que foi vitoriosa, fez muito falta a unidade por exemplo com os bancários em luta. E, hoje, mais do que nunca, faz falta a união dos trabalhadores, dos estudantes e demais movimentos sociais contra o ajuste fiscal e a pauta conservadora do Congresso. Os ataques que sofremos dos nossos patrões não são ataques isolados, sendo assim precisamos de respostas unitárias, não isoladas.

Só assim conseguiremos reunir forças para se contrapor à saída dos governos para a crise. O caminho não é fácil, até mesmo porque o Congresso aprovou e alterou pra pior, recentemente, um projeto do Executivo que criminaliza as manifestações. A lei antiterrorismo, criada sob o pretexto de preservar segurança durante as Olimpíadas e outros eventos, tem uma tipificação ampla para o crime de terrorismo que poderá ser usada para reprimir movimentos sociais e manifestações populares. Além disso, dá margem para interpretações subjetivas da Justiça.

Trabalhadores de todo o mundo, que já vem sofrendo com a crise internacional desde 2008, vêm realizando mobilizações sistemáticas e até mesmo greves gerais que paralisam completamente os seus países mesmo com toda a repressão do Estado. Devemos nos espelhar nesses exemplos para aqui, no Brasil, construirmos uma forte resistência contra a ofensiva sobre os nossos direitos e sobre o patrimônio do país. Juntos somos mais fortes.