O Direito Penal Econômico e os Fundos de Pensão – Parte III (*)

Por Cacau Pereira, pesquisador do Ibeps

Por Cacau Pereira é pesquisador do Instituto Brasileiro de Estudos Políticos e Sociais – Ibeps

Tramita no Senado o Projeto de Lei (PLS) 312/2016, apresentado, à época, pelo então Senador José Aníbal (PSDB/SP).

O Projeto estende a incidência dos crimes financeiros previstos na Lei 7.492/1986 – Lei do Colarinho Branco – aos gestores de entidades abertas e fechadas de previdência complementar e unidades gestoras de regimes próprios de previdência social. Estabelece ainda novos tipos penais, como os crimes de gestão fraudulenta e temerária e inclui os fundos de pensão no rol das instituições financeiras.
O PLS introduz um § 1º ao art. 1º, da Lei 7.492/86, nos seguintes termos:
 
“§ 1º Equipara-se à instituição financeira: 
I – a pessoa jurídica que capte ou administre seguros, câmbio, consórcio, capitalização ou qualquer tipo de poupança, ou recursos de terceiros; 
II – a pessoa natural que exerça quaisquer das atividades referidas neste artigo, ainda que de forma eventual.
§ 2° Os crimes e penalidades previstos nesta Lei aplicam- se aos gestores das entidades abertas e fechadas de previdência complementar.”

Em 2019 foi aprovado o substitutivo ao Projeto pela Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) do Sendo e a proposta foi enviada à Câmara dos Deputados. O texto alternativo foi elaborado pelo relator, então Senador da República, Antônio Anastasia (PSDB-MG) e traz, como novidade, o enquadramento criminal da facilitação à prática de gestão fraudulenta ou temerária.
Em defesa do substitutivo, Anastasia ressaltou no parecer que

“Os tribunais superiores vêm entendendo que toda e qualquer empresa que capte ou administre seguros, câmbio, consórcio, capitalização ou qualquer tipo de poupança, ou recursos de terceiros, como no caso dos fundos de pensão, é, por efeito da Lei 7.492, de 1986, equiparada a instituição financeira. Assim já é possível concluir que atos de gestão fraudulenta ou temerária em entidades previdenciárias configuram crime contra a ordem financeira. Para que haja segurança jurídica, todavia, a matéria deve ser expressamente prevista em lei”. 

Em artigo anterior desta Série já havíamos alertado acerca dessa postura dos tribunais superiores, que confronta com a Lei Complementar 108.
O relator, generalizando e em pré-julgamento das gestões dos fundos de pensão, ainda afirmou à Agência de Notícias do Senado que

“As perdas bilionárias acumuladas nos últimos anos pelos principais fundos de pensão brasileiros (Postalis, Petros, Funcef e Previ), em decorrência de atos de gestão fraudulenta e temerária, demandam ação imediata do poder público. Ademais, as grandes operações protagonizadas pela Polícia Federal demonstram que é preciso contar também com essa instituição no combate aos chamados ‘crimes de colarinho branco’”.

O controle sobre a administração dos fundos interessa aos participantes e à sociedade em geral. Mas, a referência explícita dirigida exclusivamente às entidades fechadas de previdência complementar, pode ser reveladora de objetivos implícitos no Projeto, como o de criminalizar a gestão dessas entidades e abrir caminho para retroceder na presença de representantes dos participantes na administração, instituindo administrações controladas e afinadas com o mercado financeiro.
No mesmo sentido de Anastasia se expressou o ex-Senador José Aníbal, autor do projeto original

"Os principais fundos de pensão — Correios (Postalis), Petrobras (Petros), Caixa Econômica Federal (Funcef) e Banco do Brasil (Previ) — acumularam perdas de R$ 113,5 bilhões nos últimos cinco anos, conforme relatório final da Comissão Parlamentar de Inquérito dos Fundos de Pensão. Os trabalhos da comissão mostram que houve má gestão, investimentos em projetos de alto risco, ingerência política e desvios de recursos das entidades. É preciso rigor na punição das pessoas responsáveis por tais crimes”.

Não há dúvidas de que as regras de governança dos fundos podem e devem ser aprimoradas, ampliando o controle dos participantes sobre o seu patrimônio. No entanto, a investida de notórios representantes do mercado financeiro, travestidos de paladinos da moralidade, exige a atenção de cada um acerca da disputa de interesses que envolve o mercado representado pelos fundos de pensão.
Em continuidade a esse complexo debate, vamos explicar, no próximo artigo, os novos tipos penais propostos no PLS 312/2016.